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07/ago

Glúten: mocinho ou vilão?

Cerca de 29% da população adulta dos Estados Unidos, ou seja, 70 milhões de pessoas, garante que está tentando cortar o consumo de glúten, de acordo com um levantamento divulgado pela empresa de pesquisas NDP. No Reino Unido, esse número dobra para 60% dos adultos que já compraram um produto sem glúten, de acordo com dados do site de pesquisas YouGov, e em 10% dos lares há alguém que acredita que glúten faz mal para a saúde.

Isso comprova que o “não” ao glúten é um movimento no mundo inteiro.  Mas ele é mesmo uma necessidade mundial? O jornalista da BBC William Kremer, que diz ter suas razões para ter deixado de comprar pães e bolos tradicionais, ainda não tem certeza do porquê de tantas pessoas estarem cortando esse alimento de suas dietas.

“É assim que você se livra do glúten na sua vida: primeiro, tire todo os pães, farinhas e cereais matinais de trigo do seu café da manhã. Em seguida, jogue fora todos os potes de manteiga ou geleia que estavam abertos, porque pode ter migalhas de pão ou bolacha neles. Além disso, chame seus amigos para acabar com todas as cervejas que você tenha em casa. Milhões de pessoas estão fazendo isso e muito mais à medida que estão convertendo seus corpos em áreas livres de glúten”, diz ele.

Kremer conta que entrou nos 2,6 milhões de lares que não consomem glúten quando seu filho Sam, de quase dois anos, contraiu o que parecia ser um vírus. Meses depois, na área de emergência de um hospital, um pediatra mencionou pela primeira vez algo que eu nunca tinha ouvido falar: doença celíaca. Um exame de sangue e uma biópsia confirmaram que Sam tinha essa doença autoimune que é causada pelo glúten, um conjunto de proteínas.

O glúten pode ser encontrado no trigo e proteínas muito semelhantes estão presentes na cevada e no centeio. Segundo os médicos, até mesmo uma migalha de pão pode desencadear os sintomas de Sam.

Dificuldades para processar o glúten
Vivemos um retrocesso evolucionário. Volte no tempo 10 mil anos e todo mundo estava numa dieta sem glúten. E então eles começaram a cultivar a terra: uma revolução agrária que deu à nossa espécie tempo livre para construir civilizações e desenvolver cultura e tecnologia.

Os seres humanos têm muito a agradecer ao glúten. Ele transforma o pão em um produto mais suave ao fazer com que a massa cresça durante a cocção.No corpo dos celíacos, a presença do glúten faz o sistema imunológico acreditar que está sendo atacado por micróbios.  Mas ele é a única das proteínas que não pode ser decomposta totalmente pelo corpo humano e transformada em aminoácidos.

O máximo que conseguimos fazer é dividi-lo em cadeias de ácidos chamados peptídios.

Eles normalmente passam pelo corpo da maioria das pessoas. No entanto, os sistemas imunológicos de celíacos (pessoas que sofrem do transtorno) são geneticamente predispostos a vê-los como micróbios invasores. Uma guerra começa e há vários efeitos colaterais: uma redução das vilosidades intestinais, dobras que cobrem o intestino delgado e são responsáveis por absorver os nutrientes e levá-los até o fluxo sanguíneo.

À medida que se atrofiam, sua superfície diminui e não faz seu trabalho como deveria.

Dieta da moda
A doença celíaca afeta cerca de 1% das pessoas do mundo desenvolvido, de onde se tem dados. Mesmo com essa abrangência, isso não explica a crescente popularidade da dieta sem glúten. Segundo a empresa de análise de mercado Mintel, 7% dos adultos britânicos evitam o glúten por conta de alergia ou intolerância (estritamente falando, a doença celíaca não é nem uma coisa nem outra) e mais de 8% o evitam por conta de um “estilo de vida saudável”.

A opinião de que o glúten faz mal não apenas para celíacos, mas para todo mundo, é apoiada por uma corrente de blogueiros, nutricionistas que vendem best sellers e famosos.

Um levantamento da Mintel estima em US$ 9 bilhões o mercado americano de produtos sem glúten. Uma análise nas buscas online nos últimos anos sugere que o aumento do interesse nas dietas sem glúten tem pouco a ver com uma crescente consciência sobre o celíaco e está muito mais relacionado à popularidade de dietas como a “paleo”, que busca um retorno à Idade da Pedra no que se refere a hábitos alimentares.

Mas muitos acabaram se interessando pelo conceito de abrir mão do glúten pela simples razão de acreditarem que isso as fará se sentir melhor.